Research

Dinâmica de Mercado do Transporte Aéreo – Cidade de Lisboa

Os Autores

Jorge Lucas, Assessor Técnico da APTTA

e Rui Carapeto, Economista e Professor Universitário

 Lisboa/Set./2012

O aeroporto da Portela desempenha hoje em dia duas funções distintas: 1. porta de entrada e saída da cidade de Lisboa e do país e, 2.placa giratória para os passageiros que viajam em trânsito via Lisboa. Ambas as funções são de extrema importância traduzindo-se em mais-valias quer para a cidade, quer para o país.

Para as Companhias aéreas nacionais, TAP e SATA, ao servirem os passageiros que entram e saem de Lisboa, e também os passageiros que viajam em trânsito, verifica-se uma complementaridade entre as duas funções referidas. Já relativamente às outras Companhias que voam para Lisboa, em termos de fluxos de tráfego, o aeroporto da Portela constitui simplesmente uma porta de entrada e de saída da cidade e do país.

Importaassegurar o melhor possível estas duas funções. Por um lado maximizando o número entradas de turistas na cidade de Lisboa, pois tratam-sede turistas que nos visitam e que gastam dinheiro localmente contribuindo assim para a economia da cidade e do país. Por outro lado,contribuindo para o crescimento das exportações de serviços de transporte aéreo, graças ao aumento do tráfego de passageiros que viajam via Lisboa.

Queremos que o transporte aéreo, especialmente as companhias nacionais, traga cada vez mais passageiros a Lisboa e a Portugal, mas queremos igualmente continuar sendo um país exportador de serviços de transporte aéreo, contribuindo positivamente para o “Saldo da Balança de Serviços de Transportes”.

Aeroporto da Portela–sua importância para a economia nacional e para Lisboa

Do total de passageiros movimentados nos aeroportos nacionais (incluindo as regiões autónomas),o Aeroporto da Portelamovimenta cerca de 50% do total[1].Uma parte destes são residentes e outros visitam-nos na qualidade de turistas,podendo tercomo destino final a própria cidade de Lisboa e seus arredores ou outro qualquer ponto do país, continente ou ilhas.

A outra parte significativa destes passageiros é tráfego de ligação que escala Lisboa em trânsito entre a Europa e as Américas (principalmente Brasil), ou entre a Europa e África (principalmente PALOP).

É do conhecimento geral,que a principal companhia aérea responsável por assegurar estas ligações entre a Europa, América e África é a TAP. Em termos do seu volume de negócios, cerca de dois terços provem deste tráfego de ligação e apenas um terço diz respeito ao tráfego com origem ou destino final em território nacional.

O aeroporto da Portela constitui assim uma verdadeira plataforma giratória ou Hub operacional, gerador de riqueza para o país através do seu contributo para a“Balança de Transportes” (Gráfico 1).

Gráfico 1 – Balança de Transportes (1996/2011)

Gráfico 1

 Fonte:  Estudo de caracterização do POEM – 08/2010, com actualização dos autores de 2009 a 2011, dados INE e BdP

Dado que estamos perante dois tipos de tráfego com características e impactos diferentes, importará então questionarmos: qual a contribuição de um e outro para a riqueza do país e da cidade, quer directamente através da prestação de serviços de transporte aéreo quer indirectamente através da contribuição para outras actividades económicas relacionadas ou de forma induzida,e para turismo?

Podemos comparar uma infra-estrutura aeroportuária a uma grande unidade industrial, pela importância que ela representa, quer para a região em que está implantada quer para o país, apresentando no entanto “prós” e “contras”.

Pelo lado dos “prós”, ter uma infra-estrutura aeroportuária na cidade, significa ter uma porta de entrada privilegiada para um grande número de turistas que, ao nos visitarem, vão dinamizar um conjunto de actividades relacionadas com o Turismo, contribuindo positivamente para a economia da cidade e da região na sua área de influência e assim para a economia nacional.

Pelo lado dos “contras”,a existência de uma estrutura aeroportuária na cidade, traduz-se inevitavelmente em termos de um acréscimo da poluição do ar (não facilmente mensurável pelo cidadão comum) epoluição sonora (a qual bastante bem mitigada hoje em dia pela grande redução do ruído que os motores das aeronaves tem registado nas últimas décadas, assim como a limitação das operações de descolagem e aterragem no horário nocturno.

A importância que o sector do transporte aéreo representa para a economia nacional pode ser medida através do impacto no PIB (Gráfico 2) e na criação de emprego (Gráfico 3), considerando os respectivos efeitos, directos, indirectos e induzidos e ainda no turismo.

Gráfico 2 – Contribuição para o PIB

Gráfico 2

Fonte: Oxford Economics – Economic Benefits from Air Transport in Portugal 2011

Gráfico 3 – Contribuição para o Emprego

Gráfico 3

                                     Fonte: Oxford Economics – Economic Benefits from Air Transport in Portugal 2011

 Aeroporto da Portela – hub estratégico nacional e a sua importância para a Cidade de Lisboa

 Para esta análise, utilizaremos (Figura 1), no lado esquerdo incluiremos apenas o efeito Hub – TAP na Portela, medido pelo seu peso em termos de volume de negócios que representa para esta operadora. No lado direito, fomos determinar o efeito Turismo, medido pelo número total de turistas transportados pelos vários operadores, incluindo as Low-Cost Carriers (LCC), e considerando a despesa média por estadia na cidade e área envolvente.

Figura 1 – Quantificação efeito Hub vs Turismo Lisboa

Figura 1

 Fonte: Várias dos autores

Como principal conclusão da análise efectuada, verifica-se que o contributo para a economia nacional do efeito Hub – TAP, como efeito exportador de serviços, é claramente superior ao do Turismo para a cidade.

Se ainda assim, considerarmos estimativas para outras receitas relevantes, tais como: taxas aeroportuárias pagas à ANA pela utilização da Portela pelas LCC e outros operadores estrangeiros (18,0 M€ e 30,6M€ respectivamente), e ainda o volume de negóciosponto-a-ponto da TAP, (passagens vendidas no exterior no valor 307,2 M€), verifica-se que o efeito Hub –TAP, continua a ser superior.

Segundo a ATAG – Air Transport Action Group, em termos mundiais, prevê-se que em 2030 o número de passageiros transportados duplique relativamente a 2011, passando de 2,8 mil milhões, para perto dos 6 mil milhões. Por região geográfica, e para o período 2010-2015, o crescimento anual do tráfego de passageiros internacional previsto, é o que se apresenta no Gráfico 4.

Gráfico 4 – Crescimento Anual Previsto por Região(2010-2015)

 Gráfico 4

Fonte: Aviation/Benefits Beyond Borders – ATAG (Março 2012)

Os dados deste quadro permitem-nos identificar quais as zonas geográficas do globo com maior potencial de crescimento do tráfego aéreo, nos próximos anos. Trata-se de uma informação relevante para as companhias aéreas nacionais,sobretudo para a TAP, em termos de orientação estratégica de negócio.

Ao nível do espaço aéreo europeu controlado peloEUROCONTROL[2], o modelo de previsão utilizado por esta entidade para a evolução do tráfego, assumindo três cenários de crescimento diferenciados, é revelador de um crescimento bem mais moderado nesta região (Gráfico 5).

Justifica-se no caso da TAP, que a política nacional de transporte aéreo constitua um fator de dinamização do efeito Hubcentrado no aeroporto da Portela, de forma a permitir à companhia desenvolver, sem constrangimentos operacionais, uma estratégia empresarial de liderança europeia nas travessias atlânticas, seja nas ligações com o Brasil seja com os países africanos de expressão Portuguesa.

                             Gráfico 5 – Previsão de Movimentos na Área Estatística de Referência do EUROCONTROL[3]

Gráfico 5

1AAGR – taxa média anual de crescimento no período considerado

O fraco crescimento esperado do número de voos no espaço do Eurocontroldeve-se sobretudo ao fraco desempenho económico previsto para os países que integram esta área. Também a instabilidade política verificada no Egito, Líbia e na Síria, o aumento do preço do petróleo e as falências das companhias Spanair e Malev, contribuem para este fraco desempenho. Com base nestas previsões, só em 2014 é que se prevê que o número de movimentos ultrapasse o valor atingido em 2008.

No que diz respeito às low-costcarriers, embora estas continuem a apresentar elevados níveis de passengerloadfactor[4] na sua operação, o crescimento da sua quota de mercado no espaço Europeu tem evidenciado algum abrandamento (Quadro1).Muito fruto do alargamento das redes de comboios de alta velocidade na Europa mas também devido à entrada em vigor do esquema de compensação das emissões de CO2[5], que constitui um fator adicional de pressão sobre a exploração das transportadoras aéreas.

Quadro 1 – Crescimento por Segmento de Mercado 2010/2011

 Tipo de Transportadora

Quota

Tradicional carriers

4,1%

Low-costcarriers

3,9%

Fonte: EUROCONTROLMedium-TermForecast(área estatística de referência do EUROCONTROL)

Apresentandoaáreametropolitana de Lisboa um dos menores ráciospassageiros por aeroporto/população residente, das capitais europeias, o que aliado à política de reforço dos fluxos turísticos para Lisboa, este fator induzirá ao aumentodo interesse destes operadores pela capital,o que levará ao reforçonos próximos anos da sua quota de mercado na Portela (Quadro 2).

Quadro 2 – Market Share por Segmento deMercado em 2011

Tipo de Transportadora

Europa

A. Portela

Tradicional carriers

57%

80%

Low-costcarriers

22%

14%

Fonte: EUROCONTROLMedium – TermForecast(área estatística de referência do EUROCONTROL)

Um dos riscos do reforço da operação do tráfego low-cost na Portela, é o de antecipar a data prevista de saturaçãodesta estrutura aeroportuária, com todos os inconvenientes sobretudo para a transportadora dominante – TAP. Este cenário de saturação provocará um bottleneck para o Hub da TAP, estrangulando todo o seu processo de exploração e degradando a qualidade do serviço prestado podendo mesmo colocar em causa a sua prestação.

Uma vez caracterizado aquele que poderá ser o contexto internacionalnoque se refere às principais tendências do transporte aéreo nos próximos anos, vamos seguidamente simular e quantificar os efeitos Hub-TAP e Impacto no Turismo em Lisboa, de uma hipotética deslocação do tráfego low-cost do aeroporto da Portela para um aeroporto alternativo, solução esta conhecida como “Portela +1”.

Medida inscrita no Memorando de entendimento com a Troika e já várias vezes anunciada mas, ao que tudo indica, continua ainda em fase de estudo desconhecendo-se até hoje a decisão final sobre qual a infraestruturaa serselecionada.

Solução“Portela +1” –Quantificação do efeito deslocamento do tráfego Low-Cost para um aeroporto alternativo

Vamos em primeiro lugar avaliar a capacidade da Portela para acomodar o crescimento previsto dotráfego aéreo até 2018.

Apresenta-se no Gráfico 6, as estimativas de crescimento anual do tráfego para o aeroporto da Portela com base nos dados doEUROCONTROL, para o período de 2012 a 2018, e que servirão de base à simulação para a medição do impacto da deslocação das low-cost deste aeroporto.

Gráfico 6 – Cenários de Crescimento do Tráfego Aéreo Portela

Gráfico 6

Fonte: EurocontrolMedium–TermForecast (2012-2018), Fev. 2012

Com base nas previsões do EUROCONTROL, podemos concluir que o programa de expansão da Portela em fase de conclusão, num valor estimado pela ANA-Aeroportos de Portugal em 380 milhões de euros[6], apenas acomodará o crescimento do tráfego nos cenários de crescimento base ou médio e reduzido. Caso se verifique o cenário de crescimento elevado, a capacidade da Portela esgotará até ao final de 2018.

A deslocação do tráfego low-costda Portela, ao que tudo indica, far-se-á para uma estrutura aeroportuária militar na região de Lisboa, a adaptar para esse efeito sendo aquela que reúne maior consenso, a Base Aérea do Montijo. Esta solução, já tinha sido de resto proposta como alternativa à construção do novo aeroporto na região de Lisboa[7]. Este estudo revela que em termos de valor privado do projeto (na vertente económica e financeira), a opção “Portela+1” com localização no Montijo é dominante relativamente a outras alternativas de localização analisadas.

Em termos de número de movimentos (aterragens/descolagens), assumindo que as low-cost foram responsáveis em 2011 por cerca de 19.530 movimentos na Portela, a sua deslocação para o aeroporto low-cost do Montijo dará uma média diária de 54 movimentos/dia (3 movimentos/hora).

Espera-se no entanto que, com um aeroporto dedicado às low-cost e que beneficie de custos de funcionamento e taxas aeroportuárias significativamente mais baixas, irá ser captado tráfego adicional para a cidade de Lisboa. A operadora Ryanair ainda recentemente mostrou o seu interesse por vir a operar a partir deste aeroporto podendo arrastar outras nesta decisão.

Em termos de análise, procedemos ao cálculo dos efeitos considerando como horizonte final2015, altura em que consideramos ser possível ter já o aeroporto low-cost no Montijo a operar a 100%, e comparámos com os dados já calculados para 2011.

Para o cálculo do efeito Turismo na Portela considerámos uma taxa de crescimento de 3%/ano do número de turistas, face a 2011. Para o aeroporto low-cost, assumimos como primeiro ano de operação 1 milhão de passageiros transportados, dos quais 250.000 são turistas que entram em Lisboa.

Para o efeito Hub-TAP na Portela em 2015, consideramos até 2014, comparativamente a 2011, um crescimento de 7,5%/ano do volume de negócios Hub (ou seja tráfego de ligação), em 2015 consideramos um efeito reforçado (10%/ano), em consequência da transferência dos voos low-cost para a alternativa “+1”.

Como principal conclusão da análise efectuada (Figura 2), verifica-se que a opção pela adaptação de uma estrutura militar para aeroporto low-costpotencia o efeito Hub da TAP,efeitoesse que poderá ainda ser alargado às outras operadoras tradicionais que operam na Portela. Este efeito em 2015é o dobro do efeito Turismo se incluirmos ainda o aumento do tráfego low-cost no Montijo.

Embora o efeito Turismo para a cidade de Lisboa seja relevante, o efeito Hub-TAP ésuperior evidenciando uma dinâmicaexportadora de serviçosque sai claramente reforçada, permitindo à companhia tirar partido de uma capacidade adicional disponível para aumentar a rede de operação ou incrementar afrequência voando para mercados com maior potencial de crescimento.

Figura 2 – Quantificação efeito Hub vs. Turismo Lisboa

2011 e 2015 com “Portela +1”

 Figura 2

Independentemente da bondade das previsões assumidas, o facto é que a opção de se investir na transformação de uma estrutura aeroportuária militar num aeroporto low-cost, podendo a escolha recair sobre o Montijo, é reveladora de bom senso e esta decisão deverá ser tomada quanto antes.

Relativamente a outros stakeholdersque poderão ser ainda ser considerados, caso da ANA e da Força Aérea Portuguesa, esta solução poderá mostrar-se tambéminteressante. No caso da ANA, a deslocação de tráfego da Portela reverte-se numa perda de receita imediata no entanto recuperável a prazo, podendo até vir a ser “compensada”, com a entrega da concessão de ambas as infraestruturas. Esta solução traria valor para a ANA, sobretudo na eminência da sua privatização.

Quanto à Força Aérea Portuguesa, a perda de exclusividade da Base Aérea no Montijo, com a consequente perda de protagonismo militar em virtude de um maior peso da operação civil, poderá ser compensada pela redução de custos com esta estrutura, podendo igualmente vir a beneficiar de alguns dos investimentos que se vierem a fazer.

Anexo:

Pressupostos da análise para o ano base=2011

Turismo Lisboa e Área Promocional de Lisboa

Nº de Turistas entrados em Lisboa por   via aérea 2,150Milhões
Estadia   média em Lisboa 3 dias
Gasto   médio/dia/turista 131 €

Aeroporto da Portela

Tráfego passageiros 14,0   Milhões
Dos quais:

Outros   operadores estrangeiros

3,4 MilhõesLCC2,0 MilhõesTaxa aeroportuária   p/pap9 €


[1] Com base no estudo da Oxford Economics – “EconomicBenefitsfromAirTransport in Portugal 2011”

[2]EUROCONTROL- Organização Europeia para a Segurança Aérea. É uma organização inter-governamental que congrega 39 Estados membros e a UE.

[3]EUROCONTROL Medium – Term Forecast – IFR Flight Movements 2012-2018 (número de aterragens e descolagens).

[4]Passenger load factor – medida do nível de utilização da capacidade do avião.

[5]Emissions Trading Scheme.

[6] Sendo que o valor do investimento no Terminal 2 da Portela (atual terminal low-cost) foi apenas de 38 milhões de euros.

[7] Estudo “Avaliação Económica do Mérito Relativo da Opção “Portela+1”, elaborado para a Associação Comercial do Porto pelo CEGEA da Universidade Católica Portuguesa e pela TRENMO, em Novembro de 2007.

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